Terras Indígenas

Capadr decide convocar ministra

Cansados de convites rejeitados, Junji e membros da Comissão de Agricultura aprovam convocação de Gleisi Hoffmann para prestar esclarecimentos sobre identificação e delimitação de áreas de uso exclusivo dos índios

10/04/2013


A Capadr – Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara aprovou, nesta quarta-feira (10/04/2013), a convocação da ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, para prestar esclarecimentos sobre a identificação e delimitação das terras indígenas no Brasil. “É o único meio constitucional de forçar o comparecimento da autoridade nesta Casa para explicar o porquê da letargia do governo diante da injustificada multiplicação de reservas e do agravamento de conflitos entre povos indígenas e produtores rurais”, afirmou o deputado federal Junji Abe (PSD-SP), ao votar a favor da proposta.

A decisão de convocar a ministra resulta da rejeição a sucessivos convites de parlamentares para que a titular da Pasta viesse à Câmara debater o assunto. Para todos os casos, Gleisi sempre mandou representantes. Atualmente, a Constituição Federal obriga a autoridade a comparecer no colegiado onde houve um requerimento de convocação, votado e aprovado pelo grupo, sendo a recusa passível de punição por crime de responsabilidade.

Segundo Junji, os defensores do agronegócio estão revoltados com a multiplicação de demarcações de terras indígenas pela Funai – Fundação Nacional do Índio, apesar de decisão contrária do STF – Supremo Tribunal Federal sobre a reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima. Em 2009, a Corte impôs 19 condicionantes.

Os conflitos entre indígenas e proprietários rurais agravaram-se após a suspensão, por pressão de organizações internacionais e movimentos indigenistas, da Portaria 303/2012 editada pela AGU – Advocacia Geral da União que objetivava regulamentar a decisão tomada pelo STF, estendendo para todo o País as definições adotadas pela Corte no caso de Roraima – julgamento da Petição 3.388-RR, de iniciativa popular.

Sem criar qualquer regra nova e apenas padronizar as já existentes para atuação de órgãos da União de acordo com as definições do STF, a portaria também assegurava a “participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus territórios”. Junji disse que era “um canal para dar voz à comunidade não indígena, integralmente excluída” do processo.

Além de impedir a oferta de uma série de serviços imprescindíveis à sociedade, a suspensão da portaria não beneficia nem as comunidades indígenas que ficam privadas de saúde, educação e segurança, entre outros benefícios. “A simples demarcação de terras não garante esta infraestrutura”, observou Junji que também preside a Pró-Horti – Frente Parlamentar Mista em Defesa do Segmento de Hortifrutiflorigranjeiros.

A norma da AGU vetava a ampliação de terras demarcadas, assim como autorizava o governo a construir rodovias, hidrelétricas, linhas de transmissão de energia e instalações militares dentro das aldeias sem autorização da comunidade indígena que vive ali. Estes eram os dois pontos que mais incomodavam as organizações representantes dos índios.

Os defensores do agronegócio na Câmara tentaram, de todas as formas, convencer o governo a retomar os efeitos da Portaria 303/2012. Entretanto, tudo ficou apenas na promessa. As Pastas que cuidam do assunto, como a da Justiça e a de Relações Exteriores, “vem fazendo corpo mole”, de acordo com a definição de Junji. Ele observou que o contexto motivou a aprovação da convocação da ministra-chefe da Casa Civil.

Cientes da usual manobra do governo de mobilizar sua base aliada para evitar o aval das comissões às convocações, Junji e os ruralistas partidários da convocação da ministra surpreenderam os governistas com a apresentação do requerimento extrapauta. Apesar dos protestos de alguns parlamentares do PT e do PMDB, a proposta dos deputados Luis Carlos Heinze (PP-RS), Valdir Colatto (PMDB-SC), Duarte Nogueira (PSDB-SP) e Domingos Sávio (PSDB-MG) foi votada e aprovada pela Capadr. Gleisi deverá ser notificada até o final desta semana.

Arbitrariedade
“Queremos moralizar o processo e dar voz à comunidade não indígena, impedida de se manifestar”, reforçou o deputado federal Junji Abe (PSD-SP). No modelo repudiado pelos ruralistas, norteado pelo Decreto 1775/96, a decisão fica a cargo da Funai que elabora um relatório antropológico para identificação e delimitação da área pleiteada pela comunidade indígena. “O processo corre em sigilo até o término dos estudos e publicação das conclusões”. Então, começa o prazo de 90 dias para manifestação dos interessados, exclusivamente quanto a indenizações ou eventuais vícios formais do processo.

A única oportunidade de voz dada à comunidade não indígena é depois da conclusão do estudo antropológico. E, mesmo assim, não são aceitos questionamentos de mérito ou em relação à oportunidade e razoabilidade da demarcação, como reclamou Junji, apontando que o processo de elaboração do relatório antropológico ignora aspectos socioeconômicos, políticos, de desenvolvimento regional e também não analisa a conveniência de comprometer extensas áreas do território nacional, além de excluir totalmente a participação do Poder Legislativo.

Terminado o prazo, é a própria Funai que aprecia as manifestações das partes. A etapa seguinte cabe ao Ministério da Justiça que edita portaria declarando os limites de terra indígena e determinando sua demarcação. Por fim, o processo é submetido ao presidente da República para homologação por decreto.

Desproporcionalidade
As atuais reservas indígenas, constituídas por Lei Federal, somam 106.739.926 hectares, onde vivem 517.383 indivíduos, conforme dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Significa uma média de 206,31 hectares per capita. Ou seja, 2,060 milhões de metros quadrados para cada índio. “Isto corresponde a 215 campos de futebol para cada um”, calculou Junji. Ele lembrou que os 5,2 milhões de estabelecimentos rurais do Brasil ocupam 3,3 milhões de km², o correspondente a 38,8% do território nacional. Já os índios e quilombolas detêm a propriedade de 12,7% da área total do País.

Na visão de Junji, o contrassenso é, sem mais nem menos, a Funai expulsar um míni produtor do pequenino espaço que ele comprou, do qual detém escritura, onde semeou e cultiva alimentos, sob o argumento – de voz única – de expandir uma reserva indígena. “Isto é jogar um brasileiro contra o outro, atear fogo, lavar as mãos e ainda atiçar a torcida para apedrejar o coitado do lavrador porque ele é branco, negro, pardo, amarelo, mas não é indígena”.

Os ruralistas também se esforçam para garantir a criação da uma CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar a atuação da Funai e do Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária na demarcação de terras indígenas e de áreas remanescentes de quilombolas. As diligências visam conter o aumento indiscriminado de áreas de uso exclusivo de índios e apurar denúncias de fraudes para a conversão de terras produtivas em reservas indígenas. Junji disse que os engodos são patrocinados por organizações norte-americanas, interessadas em frear os avanços da agropecuária brasileira no mercado internacional.

Um dos artifícios é enterrar em áreas pretendidas para transformação em reservas, cerca de 1,5 metro abaixo do solo, algumas panelas, outros utensílios domésticos e até ossos humanos retirados de cemitérios indígenas. “É uma ação para configurar o território como ocupado, historicamente, por tribos, e forçar a delimitação para uso exclusivo de índios e quilombolas”, acusou Junji.

Farsas semelhantes foram confirmadas pelo antropólogo Edward Luz, durante reunião da FPA, em agosto último (21/08). Por muito tempo, ele foi consultor da Funai e respondeu por diversas demarcações de áreas na Amazônia. “Ninguém quer sacrificar os índios. Mas, também não deseja castigar outros brasileiros igualmente vítimas de violência à medida que a falta de rédeas legais agrava conflitos, jogando uns contra os outros”, assinalou o deputado.


Mais informações:

Mel Tominaga
Jornalista – MTB 21.286
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