Terras Indígenas

Ministra admite falhas e promete regras claras

Insatisfeitos com a postura do governo, Junji e demais defensores do agronegócio exigem suspensão de todos os estudos para criação e ampliação de reservas a cargo da Funai

08/05/2013


Em quase cinco horas de um debate tenso, a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, tentou convencer os parlamentares de que o governo vem adotando medidas para conter a multiplicação indiscriminada de reservas indígenas no País. Convocada pela Capadr – Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (08/05/2013), ela admitiu falhas no processo conduzido pela Funai – Fundação Nacional do Índio e comprometeu-se a apresentar, até o fim deste semestre, uma definição de procedimentos claros para a demarcação de terras indígenas no Brasil. O deputado federal Junji Abe (PSD-SP), membro titular do colegiado, afirmou que o compromisso não basta, diante dos “descalabros” registrados nos mais diferentes pontos da Nação.

Assim como os demais defensores do agronegócio, Junji entende que o governo precisa suspender todos os estudos para criação e ampliação de reservas indígenas, “porque estão contaminados por fraudes”. Nesta semana, foram interrompidos os trabalhos da Funai, em curso no Paraná – estado da ministra. A decisão resulta de laudo elaborado pela Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. O documento apontou que em nenhum dos 15 processos demarcatórios em análise havia presença de índios nas localidades ou que elas não eram antigas o suficiente para justificar a delimitação de terras.

“O fato só comprova que está tudo muito errado na atuação da Funai. O modelo usado para criar e ampliar reservas indígenas despreza informações técnicas e se dissemina movido por interesses que não são os dos brasileiros”, acusou Junji, ao indicar a escancarada interferência de organizações internacionais nos trabalhos da fundação, com o objetivo de frear a expansão do agronegócio brasileiro e até de se apropriar de riquezas minerais do subsolo nacional. “Para isto, manobram a opinião pública explorando a figura do índio desprotegido”, completou, lembrando que muitos indígenas vêm de países vizinhos, como o Paraguai.

Duramente criticada pelos ruralistas, Gleisi rejeitou a afirmação de que a Funai é criminosa. “Mas concordo que ela não tenha critérios claros para fazer a mediação de conflitos, pelo envolvimento do órgão com a questão", admitiu a ministra. Atualmente, a fundação é a responsável pela delimitação a partir de estudos que a bancada ruralista classifica como “fraudulentos” e são o estopim dos conflitos com produtores rurais, expropriados de suas propriedades.

Um dos autores do requerimento de convocação da ministra, o deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS) reforçou que o governo não deve ceder à pressão dos movimentos supostamente indigenistas. “Os índios saem de terras demarcadas para criar outras reservas. Tem gente que está na sexta ocupação. Há ilegalidade em cima desse processo. A Funai é conivente. Vossa excelência diz que é uma dívida que a nação brasileira tem, mas um governo sério não expropria a terra de gente que tem escritura”, protestou.

Na audiência, Gleisi Hoffmann explicou que estudos referentes à ocupação de terras em outros estados já foram solicitados à Embrapa e anotou novos pedidos feitos pelos deputados. “Vamos estruturar um sistema de informações sobre a ocupação do território brasileiro. É o compromisso que nós temos. Para suspender qualquer estudo (de demarcação), eu tenho de ter informação qualificada para tanto. Outros órgãos devem ser ouvidos”, declarou, enumerando que os processos também deverão ser submetidos à análise dos ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário, evitando que haja parecer único da Funai.

Enquanto perdurar a ausência de voz da comunidade não indígena nos processos de delimitação de terras, as injustiças não serão superadas, de acordo com Junji. Ele e os demais defensores do agronegócio cobraram a retomada dos efeitos da Portaria 303/2012, editada pela AGU – Advocacia Geral da União para regulamentar a decisão tomada pelo STF – Supremo Tribunal Federal, estendendo para todo o País as 19 condicionantes adotadas pela Corte no caso Raposa Serra do Sol, em Roraima – julgamento da Petição 3.388-RR, de iniciativa popular.

Suspensa pela própria AGU, após pressão de movimentos indigenistas, até o pronunciamento definitivo do Supremo sobre o caso, a portaria não criava qualquer regra nova e apenas padronizava as já existentes para atuação de órgãos da União de acordo com as definições do STF. Também assegurava a “participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus territórios”. Junji disse que era “um canal para dar voz à comunidade não indígena, integralmente excluída” do processo.

A norma da AGU vetava a ampliação de terras demarcadas, assim como autorizava o governo a construir rodovias, hidrelétricas, linhas de transmissão de energia e instalações militares dentro das aldeias sem autorização da comunidade indígena que vive ali. Além de impedir a oferta de uma série de serviços imprescindíveis à sociedade, a suspensão da portaria não beneficia nem as comunidades indígenas que ficam privadas de saúde, educação e segurança, entre outros benefícios.

Evitando emitir opinião sobre a norma, Gleisi declarou que o restabelecimento da portaria 303/2012 não depende apenas do governo. “As diretrizes maiores dependem da decisão do STF. Esperamos as regulamentações necessárias”, observou a ministra. “O STF não deixará a Nação por muito mais tempo sem orientação”, manifestou-se, recomendando que os ruralistas se movimentem para cobrar o parecer da Corte. “Uma vez confirmada a decisão do Supremo, todos os processos de demarcação deverão ser reanalisados em face das 19 condições fixadas e aplicadas a toda a área jurídica mediante a portaria. Quanto mais rápido for o julgamento, maior clareza e certeza teremos em relação às condicionantes. É essencial que o Supremo venha a consolidar sua posição”, afirmou o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.

Diante do plenário lotado de parlamentares, índios e líderes rurais, a ministra pediu serenidade e colaboração para lidar com o problema. Gleisi destacou que o governo precisa se submeter à Constituição Federal. “Estamos buscando procedimentos para evitar conflitos, como a criação de um sistema de informação para qualificar estudos”, garantiu, defendendo “uma solução que contemple a justiça e a produção”.

Decisão do Congresso
Para corrigir brechas na Lei Máxima do País, que permitem a conduta abusiva e arbitrária da Funai – Fundação Nacional do Índio, o deputado federal Junji Abe insistiu na aprovação da PEC – Proposta de Emenda à Constituição 215/2000, que atribui ao Congresso Nacional a autorização das demarcações de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e a confirmação das já homologadas, estabelecendo que os critérios e procedimentos relativos ao tema serão regulamentados por lei.

Rechaçada por parte dos parlamentares ligados à base governista, com o argumento de que a proposta tira do Executivo a prerrogativa de comandar a política indigenista, a PEC tem maciço apoio da bancada ruralista. “Uma política indigenista que se preze não pode ser o retrato da atualidade: um festival de excrescências da Funai, que deixa os índios à mercê de interesses internacionais, sem saúde, sem educação e sem segurança, além de mutilar míni e pequenos produtores, igualmente brasileiros, que são expulsos de suas terras, apesar de tê-las comprado com trabalho e muito suor”, pronunciou-se Junji.

A cogitada troca de comando da Funai também não é vista como suficiente pelos congressistas defensores do agronegócio. “Trocam-se pessoas, mas o sistema permanece corrompido, alastrando vícios”, apontou Junji, cobrando reformulação estrutural no processo. O deputado também apoia a instalação da CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito da Funai, com o objetivo de investigar a conduta desmedida de antropólogos da fundação na ampliação das áreas de uso exclusivo da comunidade indígena. Os ruralistas denunciam uma série de irregularidades nos procedimentos.


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Mel Tominaga
Jornalista – MTB 21.286
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