Lei dos Caminhoneiros

Comissão acata nova legislação

Sub-relator do grupo, Junji defende novo texto como único meio de evitar o massacre da categoria, o desabastecimento e o encarecimento dos produtos aos consumidores

03/07/2013


Após mais de 15 dias de frustradas tentativas de votação e apesar da pressão direta do governo federal que tentava jogar por terra o trabalho da relatoria da comissão especial, encarregada de analisar a chamada Lei dos Caminhoneiros (12.619, de 30 de abril de 2012), o colegiado conseguiu aprovar o parecer, nesta quarta-feira (03/07/2013). Foram 17 votos a favor e quatro contrários ao anteprojeto que traz um novo texto para substituir a legislação vigente.

“Revogar a lei atual e propor outra legislação, legitimamente discutida com as lideranças das áreas envolvidas com a questão, é o único meio de acabar com as graves distorções das normas vigentes, que ameaçam a sobrevivência da categoria de caminhoneiros, massacram os setores produtivos, trazem o risco de desabastecimento e a certeza de preços bem maiores aos consumidores”, manifestou-se o sub-relator da comissão, deputado federal Junji Abe (PSD-SP), que também preside a Pró-Horti - Frente Parlamentar Mista em Defesa do Segmento de Hortifrutiflorigranjeiros. .

O parlamentar paulista trabalhou ao lado do relator, deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), na elaboração do anteprojeto aprovado que, agora, seguirá para apreciação do Plenário da Câmara. Se receber aval da Casa, a matéria será submetida ao Senado. Havendo aprovação do Congresso, o texto irá para sanção presidencial.

A minuta do projeto de Lei da relatoria, apresentada no mês passado (05/06/2013), permite ao motorista dirigir por até seis horas ininterruptas. A lei atual estabelece que ele dirija por até 4 horas seguidas. Este foi um dos pontos atacados pelo Planalto, com o auxílio de parlamentares da comissão que trabalharam fervorosamente em defesa da vontade do governo de manter a legislação vigente.

Na tumultuada reunião que terminou com a aprovação do parecer de Colatto e Junji, houve parlamentares que acusaram a relatoria de valorizar mais a carga transportada do que a vida humana. O comentário teve a intenção de atingir o sub-relator que, em várias oportunidades, havia alertado que os períodos de descanso estabelecidos pela legislação inviabilizavam o transporte de produtos perecíveis e de carga viva, considerando que alimentos se estragariam, correndo o risco de contaminação.

Na prática, o novo texto permite ao motorista elevar em 1h30 o tempo ininterrupto de direção, considerando que foram mantidos os 30 minutos obrigatórios de descanso. “O fato de conduzir o veículo por 5h30 em vez de 4 horas não é o fator que coloca em vidas em risco. O que faz isto é a precariedade das rodovias, a concentração dos deslocamentos de cargas no modal rodoviário e os longos períodos desperdiçados em congestionamentos monstruosos”, argumentou Junji.

Nada vale mais do que a vida humana, como enfatizou Junji. Ele disse que invocar este conceito numa discussão como a da Lei dos Caminhoneiros não passava de uma tentativa desesperada de “tentar deixar tudo como está, ignorando a voz dos setores envolvidos”. O sub-relator lembrou aos parlamentares contrários ao anteprojeto que “estamos no Brasil e não podemos querer aplicar aqui normas excessivamente protecionistas que funcionam na Suíça, na Suécia, no Japão e em outros países de Primeiro Mundo”.

Segundo Junji, os míni, pequenos e médios profissionais de todas as áreas econômicas no Brasil vêm sendo esmagados por grandes conglomerados que adquirem os menores ou se fundem com multinacionais. As normas vigentes em relação ao tempo ininterrupto de volante significam a falência dos motoristas autônomos que não conseguem ter receita suficiente para manter sua atividade. “Eu pergunto: quem serão os excluídos da categoria de caminhoneiros?”.

Os transportadores autônomos que deixarão a atividade, se não houver uma legislação adequada, engrossarão a fila de desempregados em busca de vagas nas grandes transportadoras. “Certamente, isto só trará efeitos negativos para os assalariados”, considerou Junji. Em recente pesquisa, citou ele, oito em cada dez brasileiros declararam que desejam trabalhar por conta própria. “Sepultar os condutores autônomos é o mesmo que sufocar o sonho das pessoas que lutam para ter o próprio negócio”, comparou.

O texto aprovado pela comissão especial também prevê distinção entre contratados e autônomos. O motorista assalariado continua obrigado a ter uma pausa de 11 horas depois de 24 horas de direção. Já aquele que trabalha por conta própria pode reduzir o período para dez horas, podendo fazer isso dentro do próprio veículo. Além disso, conforme o anteprojeto, os profissionais que ultrapassarem o tempo de direção permitido só poderão ser multados depois que o Dnit – Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes tiver efetivado a homologação dos pontos de parada.

Rememorando o saldo dos debates realizados com lideranças ligadas aos setores atingidos pela legislação, Junji apontou os protestos de entidades de caminhoneiros. “Com razão, acusavam que as rodovias não têm infraestrutura adequada para oferecer locais de descanso em número suficiente e de forma segura”. Ele reiterou que a ampla discussão propiciada pela comissão efetivou o que deveria ter sido feito antes da vigência da lei: “dar voz à população afetada”.

Endossando as considerações de Junji, o relator assinalou que a legislação atual aumentou o Custo Brasil, acarretando o encarecimento de cerca de 30% no frete. “É evidente que a conta vai para o bolso do consumidor final”. Junji acrescentou que os altos custos de produção e operação, somados às deficiências de infraestrutura, achatam as chances de competitividade do País no mercado internacional.

Ainda no anteprojeto da relatoria da comissão especial, figura a proposta de redução do valor do pedágio cobrado dos caminhoneiros. A norma atual prevê a definição do preço com base no número de eixos do veículo. O texto sugere que a cobrança incida somente sobre a unidade tratora, conhecida como cavalo. Os deputados a serviço da vontade do governo quiseram derrubar, de qualquer maneira, a inclusão do tema na nova legislação.

Ocorre, segundo Junji, que o preço dos pedágios está diretamente ligado à atividade de transporte, afetando não só a categoria, mas todas as cadeias produtivas. Para ilustrar, ele observou que, após as manifestações populares que tomaram as ruas do País, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), suspendeu o reajuste dos pedágios, mas anunciou que cobrará dos caminhoneiros tarifa cheia, baseada no número de eixos de cada veículo, independentemente de estarem suspensos em função de carga zero.

Outra inovação constante do anteprojeto aprovado é a cobrança das multas dos motoristas estrangeiros que trafegam no País. A ideia da relatoria é a aplicação do princípio da reciprocidade: em muitos países da América do Sul, o condutor só pode deixar o território nacional depois que tiver quitado as multas. O texto também torna obrigatório o exame toxicológico para motoristas profissionais.

Peso das pressões
Não bastasse arregimentar, entre os integrantes da comissão especial, fiéis escudeiros na tarefa de adiar a votação e tentar invalidar o relatório do colegiado para manter a atual Lei dos Caminhoneiros, o governo federal lançou mão de todas as estratégias possíveis na expectativa de forçar o colegiado a recuar.

Desde a apresentação do parecer da relatoria, por três vezes, o presidente da comissão, deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), o relator Valdir Colatto e o sub-relator Junji Abe foram chamados ao Palácio do Planalto. Nas duas primeiras, para audiências com a ministra de Relações Institucionais Ideli Salvatti e uma legião de assessores. Todos tentavam convencer o grupo a manter a legislação vigente.

A última cartada governista ocorreu na noite desta terça-feira (02/07), quando o trio foi novamente convidado para uma reunião que, a princípio, seria com a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisy Hoffmann. Lá chegando, os três deputados encontraram uma junta ministerial disposta a forçar a revisão do relatório para resguardar a lei vigente. Além de Gleisy, participaram do encontro os ministros César Borges, dos Transportes; José Eduardo Cardozo, da Justiça; e Luís Inácio Adams, da AGU – Advocacia Geral da União, acompanhados de dezenas de assessores.

A comissão especial não sucumbiu aos apelos. Marquezelli, Colatto e Junji mantiveram-se firmes na decisão de colocar o relatório em votação e de defender o novo texto para substituir a legislação atual. O sub-relator lembrou que a situação da categoria é da maior gravidade, haja vista o bloqueio de várias rodovias. “Embora sofrendo até incompreensão, os manifestantes reivindicam redução dos custos para ficarem na atividade, como preços menores para o diesel, tarifas justas nos pedágios e o fim das distorções na Lei dos Caminhoneiros – como estamos propondo”.

Defeitos da lei
Além do tempo de viagem que compromete a qualidade dos produtos perecíveis, o deputado federal Junji Abe apontou a acentuada perda de produtividade dos caminhões, decorrente da legislação em vigor. Estudos mostrados por participantes dos debates, realizados pela comissão especial, confirmaram o aumento dos custos em patamares que vão de 4,7% para percursos de até 200 quilômetros até 57,1% para 450 quilômetros. Neste último, o tempo de deslocamento dobra de um para dois dias. O levantamento considera motorista contratado no regime da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho.

Os defeitos da legislação, segundo Junji, tornam-se ainda mais sérios em razão da precariedade da logística de deslocamentos no País. “O sistema ferroviário, lamentavelmente, continua sucateado. O transporte de cargas sobre rodas é quatro vezes mais caro que pelas ferrovias. Todo fator que pressione os custos já recai sobre o preço final dos produtos”, reclamou, ao defender a urgência de maiores investimentos na implantação e modernização da linha férrea como meio de otimizar os deslocamentos de cargas e de pessoas no Brasil.

Representante máximo do segmento de hortifrutiflorigranjeiros no Congresso, Junji já havia alertado para os problemas da Lei dos Caminhoneiros no caso dos itens perecíveis. A participação de representantes de associações e sindicatos de produtores, distribuidores e centrais de abastecimento de alimentos um dos debates da comissão confirmou as preocupações.

O complexo Ceagesp – Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo, o maior da América Latina e passagem obrigatória de boa parte das cargas de produtos agrícolas distribuídos no País, corre o risco de ter sua operação paralisada em prejuízo do abastecimento no Brasil inteiro, se perdurarem as incoerências da Lei dos Caminhoneiros, como pontuou Junji.

O caso do entreposto paulistano sofre a agravante das restrições impostas pelo Município de São Paulo à circulação de caminhões. De acordo com Junji, é proibido o tráfego de veículos pesados em extensos horários, ao longo de amplos e importantes trechos da Capital, como as Marginais do Tietê e Pinheiros. “Esta norma, somada com as determinações da legislação, torna impraticável o abastecimento”, advertiu o deputado, avaliando que o texto aprovado pela comissão “corrige defeitos flagrantes” nas normas vigentes.


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Mel Tominaga
Jornalista – MTB 21.286
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